Como a Covid-19 impactou a saúde dos implantes? Guaracilei Maciel Vidigal Júnior analisa estudos e debate o tema.
Em dezembro de 2019, a OMS foi alertada sobre uma série de casos de pneumonia na cidade de Wuhan, na China, causada por uma nova cepa de coronavírus, o SARS-CoV-2. Como isso impactou a Implantodontia? A pandemia de Covid-19 teve início no Brasil em fevereiro de 2020, com a notificação do primeiro caso pelo Hospital Israelita Albert Einstein.
Em março de 2020, fechei as portas do consultório e a Uerj suspendeu as atividades presenciais. Porém, devido a um aumento atípico do número de pacientes com fraturas radiculares, retornei ao consultório em agosto de 2020 para realizar procedimentos de emergência, exodontias e instalações de implantes, quando necessário. Apesar de, até o presente momento, eu desconhecer uma publicação científica sobre a relação entre a pandemia de Covid-19 e a saúde dos dentes e implantes, o aumento do número de casos de fratura de dentes foi um fenômeno observado pela maioria dos profissionais com quem conversei. Algumas pesquisas recentes mostraram um aumento na gravidade dos sintomas de bruxismo e disfunção temporomandibular (DTM) durante a pandemia do Covid-19, causada pelas incertezas financeiras, isolamento social, estresse, aumento da ansiedade e depressão¹.
Algumas das principais causas de fraturas dentárias são o bruxismo e a DTM². Portanto, estes fatores podem justificar o aumento na demanda de tratamento de dentes com raízes fraturadas durante o período pandêmico.
Outra situação clínica que também observei durante este período pandêmico foi o aumento do número de casos de peri-implantite (definida como a perda óssea progressiva ao redor do implante). Ao contrário do que acontece com os dentes, em que o biofilme bacteriano é o fator determinante da periodontite, em implantes a perda óssea pode ser causada tanto pelo biofilme bacteriano quanto pela sobrecarga provocada pelo bruxismo³.
O caso clínico a seguir exemplifica situações clínicas que aumentaram durante este período pandêmico. Paciente do sexo feminino, com 58 anos, recebeu tratamento com implantes em 2010. Durante a fase de osseointegração, houve perda óssea no implante instalado na região do 34, que permaneceu estável nestes últimos dez anos. As figuras mostram as radiografias de controle dos anos de 2013 (Figura 1), 2015 (Figura 2), 2017 (Figura 3), 2019 (Figura 4) e 2021 (Figura 5).
A grande perda óssea ao redor dos implantes 34, 37 e 46, observada nos exames realizados entre os anos de 2019 e 2021, coincide com o relato da paciente sobre o aumento da percepção dos sintomas de DTM durante a pandemia de Covid-19. No exame clínico, foram detectadas bolsas periodontais de 5 mm nas faces mesial, distal e lingual do implante 34, na mesial do implante da região do 45 e na face vestibular do implante da região do 46. O tratamento realizado foi a raspagem subgengival com curetas de titânio das áreas com bolsas peri-implantares, e a confecção de uma placa oclusal para DTM. Além disso, a paciente foi instruída a retomar as consultas periódicas de manutenção.
Outra mudança ocorrida durante a pandemia foi que muitas consultas periódicas de manutenção deixaram de ser realizadas, devido à baixa procura de tratamentos eletivos pelos pacientes que tinham medo de contraírem Covid-19, por considerarem os consultórios dentários locais de alto risco de contaminação, devido à geração de aerossóis. O uso das medidas de biossegurança é fundamental para a proteção do paciente e do profissional, mas deve ser sempre baseado no conhecimento científico.
Desmistificando o alto risco de contaminação pelo vírus SARS-CoV-2 nos consultórios dentários, pesquisadores da Universidade de Ohio, em um trabalho publicado recentemente4, mostraram que 78% das bactérias isoladas em condensados de aerossóis gerados por procedimentos do tratamento dentário são das tubulações dos equipamentos usados, enquanto a saliva dos pacientes contribuiu com 0% da microbiota isolada do aerossol. Além disso, foi isolado o SARS-CoV-2 da saliva de pacientes portadores assintomáticos, mas nenhum vírus foi isolado do aerossol obtido no tratamento destes pacientes.
Referências
1. Di Giacomo P, Serritella E, Imondi F, Di Paolo C. Psychological impact of COVID-19 pandemic on TMD subjects. Eur Rev Med Pharmacol Sci 2021;25(13):4616-26.
https://doi.org/10.26355/eurrev_202107_26254
2. Beddis H, Pemberton M, Davies S. Sleep bruxism: an overview for clinicians. Br Dent J 2018;225(6):497-501.
https://doi.org/10.1038/sj.bdj.2018.757
3. Zhou Y, Gao J, Luo L, Wang Y. Does bruxism contribute to dental implant failure? A systematic review and meta-analysis. Clin Implant Dent Relat Res 2016;18(2):410-20.
https://doi.org/10.1111/cid.12300
4. Meethil AP, Saraswat S, Chaudhary PP, Dabdoub SM, Kumar PS. Sources of SARS-CoV-2 and other microorganisms in dental aerosols. J Dent Res 2021;100(8):817-23.
https://doi.org/10.1177/00220345211015948
Guaracilei Maciel Vidigal Júnior
Especialista e mestre em Periodontia – UFRJ, e doutor em Engenharia de Materiais – Coppe/UFRJ; Livre-docente em Periodontia e especialista em Implantodontia – UGF; Pós-doutor em Periodontia e professor adjunto de Implantodontia – Uerj.
Orcid: 0000-0002-4514-6906.