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Overdentures: qual é o patamar atual?

Especialistas discutem as vantagens e limitações das overdentures, uma das possibilidades de reabilitação para pacientes totalmente edêntulos.

Com 360 mil profissionais atuando na área, o Brasil possui o maior número de cirurgiões-dentistas no mundo. Mas, ironicamente, ao contrário do que deveria ser, grande parte da população não tem acesso à saúde bucal adequada – o que nos dá o triste título de país com o maior número de pessoas com nenhum dente na boca: são mais de 16 milhões de edêntulos totais, sendo que 41,5% se concentram na faixa etária acima dos 60 anos.

Esses dados do Conselho Federal de Odontologia (CFO) são reflexo da falta de informação, da baixa renda e da cultura de ir ao dentista somente quando sente dor ou quando acontecem problemas que incomodam muito, como dente quebrado e inflamações gengivais.

Além de abalar a autoestima e até provocar danos psicológicos, o edentulismo afeta o sistema estomatognático, prejudicando a mastigação e a fonética. As consequências biológicas também são negativas: menor estabilidade oclusal, problemas na articulação temporomandibular, diminuição progressiva da disponibilidade de mucosa queratinizada, maior risco de fratura mandibular, instabilidade protética motivada pela inclinação anatômica e redução da densidade da estrutura óssea de suporte.

Existem duas possibilidades de reabilitação para pacientes totalmente edêntulos: a prótese total removível e a prótese sobre implantes. Esta última pode ser fixa implantossuportada (também conhecida como protocolo) ou removível mucoimplantossuportada (chamada de overdenture ou sobredentadura).

Independentemente do tipo de prótese utilizada, a reabilitação oral do edêntulo total impactará de maneira positiva nos aspectos psicossociais e nutricionais do paciente. Aqui, vamos restringir a abordagem às overdentures.

CARACTERÍSTICAS

Embora não exista um protocolo específico em relação ao número de implantes necessários para suportar uma overdenture na região maxilar, a literatura recomenda, no mínimo, quatro implantes instalados na área dos caninos, incisivos e pré-molares. Mas, essa quantidade pode ser maior em alguns casos, dependendo do desenho da prótese e de fatores biológico-anatômicos.

Baseado em estudos clínicos longitudinais, revisões estruturadas e conferências, o Consenso de McGill, publicado por Jocelyne Feine et al. em 2002, indica como primeira opção para o tratamento de pacientes edêntulos na área mandibular a instalação de dois implantes bilateralmente, posicionados na região anterior entre os forâmens mentonianos – considerando que o sistema de retenção pode ser o’ring, barra-clipe, magnetos e coroas telescópicas. Embora funcione muito bem para a maioria dos pacientes, essa não é uma regra, mas sim um protocolo mínimo, já que alguns autores defendem que a retenção da prótese melhora com dois a quatro implantes.

PRÓS E CONTRAS

Como as overdentures precisam de poucos implantes, elas apresentam as vantagens de exigir menor quantidade de procedimentos cirúrgicos invasivos e envolver menos anestesias – um benefício importante por se tratar de pessoas que podem ter insuficiência nutricional por comprometimento do sistema mastigatório.

Adicionalmente, esse tipo de prótese tem menor custo e o próprio paciente pode fazer a limpeza. Isso porque a overdenture é presa a barras de fixação (podendo ter ou não cantiléver), então a pessoa consegue removê-la, higienizá-la e depois encaixar a barra de fixação.

Essa modalidade de reabilitação é indicada para casos de suporte labial insuficiente, com linha alta do sorriso, quando há necessidade de compensação prognática e pacientes com dificuldade motora para escovar os dentes ou que não se adaptaram à prótese fixa. Para realizar a carga imediata, no entanto, é pré-requisito apresentar altura e qualidade óssea, espaço protético maior ou igual a 12 mm e o arco oposto deve ser uma prótese total.

É importante ressaltar que as dificuldades de uso das próteses totais convencionais estão relacionadas à perda de habilidade motora, redução do fluxo salivar, vulnerabilidade dos tecidos fibromucosos e, principalmente, à grande reabsorção óssea. Assim, a overdenture simplifica a arquitetura protética, melhora a função mastigatória, possui boa estabilidade e retenção, tem fácil manutenção e ainda ocasiona menos traumas para os tecidos de suporte. Em relação à estética, apresenta bom resultado, embora a prótese tipo protocolo tenha uma aparência mais natural e harmoniosa.

Em contrapartida, a sobredentadura não deve ser uma opção para casos com questões ósseas desfavoráveis, que influenciem na estabilidade e sobrevida dos implantes. Também é um procedimento que deve ser evitado em pacientes que não estejam com a saúde geral estável ou sejam imunossuprimidos, devido ao risco cirúrgico.

Como complementação, ao aumentar a base da overdenture para compensar a perda de tecidos moles e duros, elas podem se tornar volumosas, o que reflete em uma desvantagem desse modelo. Além disso, como possui attachments, precisa de revisões mais frequentes para a manutenção. No caso das overdentures mucossuportadas, o desajuste basal leva à maior instabilidade e movimentação da estrutura de resina, aumentando a chance de fratura da prótese e sobrecarga dos implantes.

O QUE DIZEM OS ESPECIALISTAS

“Como milito na área da Reabilitação Oral há muitos anos, tenho um forte convívio com pacientes desdentados totais usuários de próteses totais, vivenciando seus problemas e sempre tentando auxiliá-los. A partir dos implantes, as possibilidades de tratamento melhoraram muito. A indicação das overdentures acontece para pacientes usuários de prótese total que possuem algum tipo de contraindicação para receberem reabilitações implantossuportadas. Geralmente, são casos atrelados à problema de saúde ou a limitações financeiras. Reter a prótese que apresenta problemas significa uma mudança de vida muito significativa para o paciente. Às vezes, vejo opiniões contrárias à indicação de overdenture e isso me espanta, pois esse tratamento traz benefícios. Mas, deve ficar claro que o comparativo feito aqui é entre usar uma prótese total ou uma overdenture – e não overdenture versus prótese fixa. Vale salientar também que o correto comportamento estará atrelado às boas condições de cobertura da área chapeável e à correta oclusão.”
Ivete Sartori, mestra e doutora em Reabilitação Oral.

“Pacientes que, infelizmente, são edêntulos apresentam grandes dificuldades adaptativas das próteses totais convencionais, sendo as maiores queixas relativas a desconforto, adaptação e falhas na retenção do trabalho. Próteses totais fixas sobre implantes e sobredentaduras são possibilidades para a reabilitação desses pacientes. A sobredentadura pode ser vista como uma alternativa a próteses implantorretidas do tipo protocolo, apresentando, normalmente, menor custo laboratorial e menor tempo de trabalho. A possibilidade de ser apoiada em um menor número de implantes resulta em procedimentos cirúrgicos menos onerosos e mais simplificados. Todos esses fatores aliados tornam o tratamento acessível a um número maior de pacientes. O acompanhamento e a manutenção podem ser feitos através de consulta trimestral no primeiro ano e avaliação dos hábitos de higiene do paciente.”
Mario Groisman, mestre em Ciências Odontológicas.

“Eu indicaria o uso de overdenture nas seguintes situações: 1) Pacientes que não querem passar por uma cirurgia mais invasiva e possuem pouca estrutura óssea, que inviabilize a cirurgia com mais implantes (prótese protocolo); 2) Pacientes com limitações financeiras, pois uma overdenture é bem mais barata do que um protocolo; 3) Pacientes com coordenação motora comprometida, que impossibilitaria a higienização da prótese protocolo; 4) Pacientes com severa reabsorção óssea que comprometa o suporte labial e a fala, quando confeccionado um protocolo; e 5) Pacientes insatisfeitos com uma prótese total, pela falta de retenção, e que não possuam as condições necessárias para a confecção de uma prótese protocolo.”
Eduardo Pellizzer, professor titular do Depto. de Materiais Odontológicos e Prótese da Faculdade de Odontologia de Araçatuba (Unesp).

“O menor custo e a facilidade de higienização, em comparação às próteses totais fixas implantossuportadas, têm sido os argumentos mais frequentes para a indicação de overdentures. Também é relatado na literatura um alto nível de satisfação dos pacientes, embora quase sempre o comparativo seja com próteses totais mucossuportadas. Por outro lado, quatro ou até três implantes em mandíbula são suficientes para a instalação de uma prótese implantossuportada fixa, o que não gera uma diferença significativa de valores. A higienização de uma barra de overdenture não difere tanto de um protocolo bem realizado. Além disso, a experiência nos mostra que não há nada mais deprimente para um idoso hospitalizado do que ter que remover uma prótese e ficar sem os dentes. Assim, acreditamos que as overdentures se justificam em pouquíssimos casos, como em idosos com poucos recursos financeiros e dificuldade motora, ou ainda em paciente que já possuía prótese total implantossuportada e que, por algum motivo, perdeu dois implantes e não pode mais ser operado por condições sistêmicas. Em qualquer outra situação, consideramos ser melhor a indicação de uma prótese total implantossuportada fixa.”
Franco Ignáccio Mallaguti, especialista em Implantodontia, e José Geraldo Malaguti, doutor em Biologia Oral e especialista em Prótese Dentária.