Maristela Lobo direciona a percepção clínica para questões importantes à observação da face em perfil, especialmente quanto à avaliação do posicionamento tridimensional da maxila.
Na coluna anterior, trouxemos as métricas faciais lineares como referências de orientação diagnóstica para a face. Nessa edição, o intuito é direcionar a sua percepção clínica para questões importantes à observação da face em perfil, especialmente quanto à avaliação do posicionamento tridimensional da maxila. A maxila é o elemento central à face, e seu formato e posição tridimensionais impactam direta e indiretamente no relacionamento com as demais estruturas do crânio, bem como com os tecidos moles sobrejacentes. Todas as camadas teciduais da face estão conectadas e devem ser percebidas como um conjunto.
Os ângulos faciais em perfil podem ser obtidos por meio da análise bidimensional das fotos em programas de computador, bem como através de escaneamento facial e análise tridimensional. Vamos começar focando no ângulo nasolabial (ANL), situado no ponto subnasal. Esse ângulo resulta da relação entre a columela nasal e o lábio superior em perfil. Existe uma faixa numérica “ideal” na literatura, consistente com a percepção estética, variando de 90 a 120 graus (Figuras 1), com uma média de 100 a 105 graus para as mulheres e de 90 a 95 graus para os homens. É importante observar não só o valor absoluto desse ângulo, mas também a sustentação do nariz em relação à maxila e a postura do lábio superior no que se refere ao seu volume, projeção anterior e curvatura. Essa medida é frequentemente empregada como variável de resposta quantitativa em pesquisas científicas que avaliam alterações faciais a partir de tratamentos odontológicos nos mais diversos níveis. E também pode ser observada de maneira mais subjetiva durante o atendimento clínico.
A relação angular entre o nariz e o lábio depende, fundamentalmente, do apoio à columela nasal, conferido pela base óssea (maxila), pelas características teciduais do nariz e pelo suporte ao lábio superior – resultante da posição, da altura e da inclinação do processo alveolar e dos dentes superiores. Avaliando visualmente o paciente em perfil durante o exame clínico, devemos nos atentar para: 1) o posicionamento horizontal (anteroposterior) da maxila em relação à mandíbula e à face; 2) a posição e a curvatura do lábio superior; 3) a hierarquia de projeção linear entre os lábios superior e inferior, e o mento; 4) a rotação do terço inferior da face em relação aos demais terços; e 5) o ângulo cérvico-mandibular, revelando (ou não) a divisão entre a cabeça e o pescoço.
No paciente da Figura 2, o ANL está excessivamente fechado, fora dos parâmetros estéticos. Isso ocorre por causa da protrusão bimaxilar, mas o problema foi acentuado por um preenchimento labial realizado sem a correta indicação. Na percepção do paciente, o problema estava no nariz, o qual ele considera “caído”. Desejava, portanto, que algum procedimento clínico solucionasse a questão. Possivelmente, profissionais menos atentos ao diagnóstico “venderiam procedimentos” que mais uma vez acentuariam a percepção de desequilíbrio visual na face desse paciente. Os caminhos do tratamento passariam por estabelecer um melhor posicionamento maxilomandibular entre si e com a face antes de qualquer intervenção em tecidos moles. O papel do bom profissional clínico, independentemente da especialidade, é observar atentamente, ter noções diagnósticas multidisciplinares e encaminhar o paciente para o tratamento assertivo. Jamais vender procedimento!
A relação entre lábios, nariz e mento deve respeitar uma hierarquia de posicionamento tridimensional, começando pela relação anteroposterior linear, citada na coluna anterior. Clinicamente, o ângulo nasolabial não deve ser avaliado de maneira isolada, uma vez que as alterações tridimensionais do terço inferior da face durante o tratamento odontológico podem melhorar o perfil labial e, ao mesmo tempo, piorar o ângulo nasolabial (Figuras 3).
Em seu livro “Princípios da integração estética”, o autor Claude Rufenacht cita a seguinte frase: “Sendo um conceito global, a estética não pode ser restrita à cavidade bucal. Ela requer o relacionamento harmônico de todos os elementos entre si e de cada um deles com o todo.” Essa percepção não poderia ser mais atual e pertinente ao diagnóstico que integra a face ao ambiente intraoral. O diagnóstico, independentemente da especialidade, deve iniciar pela observação atenta da face.
Com essa mentalidade, devemos entender elementos isolados, como o ângulo nasolabial, e, ao mesmo tempo, aprender a relativizar esses elementos com as estruturas que os circundam. Munidos de mais conhecimento sobre os detalhes da face, seguiremos pontuando observações diagnósticas importantes.
Maristela Lobo
Mestra em Odontologia (área de Cariologia) e doutora em Clínica Odontológica (área de Dentística) – FOP-Unicamp; Especialização em Periodontia – EAP-APCD; Professora do curso de pós-graduação lato sensu em Odontologia; Coordenadora da especialização em Periodontia Senac SP e Mandic SP; Coordenadora da especialização e do mestrado especial em Harmonização Orofacial e coordenadora da especialização em Periodontia – SLMandic.
Orcid: 0000-0003-0595-8851.