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Francesco Mintrone: digital, sem medo do tradicional

Em entrevista, o italiano Francesco Mintrone fala sobre Odontologia Digital e a importância da tecnologia no dia a dia dos especialistas.

Nascido em Modena, na Itália, Francesco Luigi Mintrone iniciou a sua atividade profissional ainda na adolescência como técnico em prótese dentária. Muito cedo, fez sua transição para clínico na Università degli Studi di Modena e Reggio Emilia e, desde então, construiu uma carreira marcada pela versatilidade e pelo perfeccionismo, trabalhando lado a lado com os grandes expoentes da Odontologia na Europa.

Nos últimos anos, Mintrone se apresenta também como um profissional que fez uma migração bem-sucedida para o digital, sem abrir mão do que as técnicas tradicionais têm a oferecer. Nesta entrevista, gravada em 2019 e conduzida por Maurício Adolfi, o professor italiano conta um pouco sobre sua carreira e sua visão sobre o melhor uso das tecnologias.

Maurício Adolfi – Como foi sua transição, no início da carreira, entre sua formação como técnico em Odontologia e cirurgião-dentista?

Francesco Mintrone – Eu comecei a trabalhar como técnico em prótese dentária no laboratório aos 15 anos, em Milão. Eu não sei por que fiz essa escolha, pois não havia ninguém na família envolvido na Odontologia. Eu cheguei a ganhar um prêmio como o melhor TPD iniciante de Milão. Quando terminei a escola, abri meu próprio laboratório, focado em cerâmica. Depois de alguns anos, eu pensei: “sinto falta de algo para compreender melhor do que se trata trabalhar em dentes”. Foi quando eu comecei minha trajetória como cirurgião-dentista. Como eu tinha a formação de TPD quando terminei a universidade, foi mais fácil. Eu já tinha uma ideia clara sobre todas as etapas de trabalho e sobre a anatomia dental, e entendia melhor o conceito de estética. A partir de um determinado momento, eu já não via mais diferença entre o trabalho de um técnico e de um clínico. E isso é algo que eu aconselho a quem deseja melhorar suas habilidades como clínico.

MA – Ainda em relação a sua trajetória, nós podemos perceber que você consegue ter ótimos resultados em diferentes áreas da Odontologia. Como surgiu a sua relação com a cirurgia periodontal?

FM – Foi a necessidade. Quando você planeja seus casos, é possível contar com outros profissionais para cuidar de uma parte do tratamento. Mas se o foco deste colega não for igual ao seu, preocupado em fazer sempre o melhor, às vezes o resultado final não chega aos 100%. Assim, percebi que precisava aprender mais sobre Periodontia, sobre implantes, sobre regeneração de tecidos etc. Sempre que eu sinto que é necessário melhorar, eu me concentro no melhor caminho para conseguir algo que me satisfaça. Então comecei a fazer cursos para melhorar minhas habilidades com implantes, e um dos meus mestres foi Mauro Fradeani, quando estivemos juntos por muito tempo. Em cirurgia, com certeza, Sascha Jovanovic me ajudou muito. Depois de um tempo, aprendi sobre implantes zigomáticos com Chantal Malavez. E, com o grupo de Marc Hurzeler, eu me dediquei mais à Periodontia. Ou seja, sempre que eu percebo que preciso me aprimorar em alguma técnica, eu procuro me concentrar na melhor maneira de obter aquele conhecimento.

MA – Falando sobre reabilitações orais completas, como você avalia a evolução dos materiais utilizados nos tratamentos ao longo dos anos e quais são as melhores opções?

FM – A partir da experiência com a reabilitação oral completa, quando não é preciso uma restauração mais acurada mimeticamente, ou seja, se eu tiver que fazer um incisivo central, eu não posso optar por uma restauração monolítica. Porque é difícil encontrar o bloco em que eu possa fresar uma restauração exatamente com a mesma cor e translucidez dos elementos antagonistas ou nos dentes vizinhos. Mas se você está planejando uma reabilitação completa, normalmente a abordagem monolítica pode ser mais rápida e previsível, sem lascar. Essa é provavelmente a tendência do nosso mercado, pois queremos atender mais pacientes e o custo da Odontologia às vezes é realmente alto. Sabemos pela literatura que um dos problemas mais importantes que temos na reabilitação total da boca é o lascamento da restauração. A taxa de lascamento, após dez anos, segundo um estudo de Panos Papaspyridakos, pode chegar a 66% – ou seja, é muito. Eu acho que nesse caso devemos considerar uma abordagem monolítica. A abordagem monolítica, com o material que temos, é realmente previsível, a estética é ótima. Temos materiais de zircônia que combinam resistência, transparência e estética. Então agora, especialmente nos casos grandes, estou sempre tentando fazer uma abordagem monolítica. Ou, se eu colocar um pouco de cerâmica, será apenas na área frontal, nunca na área funcional. Sempre deixo a orientação interior completamente em monolítico, assim o aspecto bucal do incisivo superior se aproxima do natural.

MA – Você se apresenta como um “cara digital”. Você acha possível realizar um tratamento com fluxo de trabalho totalmente digital? Quais são suas perspectivas para o futuro nesta área?

FM – Há alguns anos, eu realmente era cético sobre a Odontologia digital. Minha principal preocupação não era com a precisão dos equipamentos ou a qualidade dos materiais, mas sim com a oportunidade de criarmos a orientação espacial perfeita sobre o plano de oclusão. Temos que entender o caminho tradicional para saltar à Odontologia digital, e isso pode criar distorções. Afinal, quanto mais etapas em um fluxo de trabalho, maior é a chance de cometer erros. No entanto, atualmente existem empresas e softwares que oferecem esta oportunidade. Para mim, se tiver que considerar uma reabilitação oral baseada em uma combinação de especialidades diferentes, por exemplo, a Odontologia Digital é perfeita. Isso porque podemos criar o que eu chamo de “paciente digital”. Você pode colocar todas as informações dele em um sistema: diferentes expressões faciais, movimentos da mandíbula, modelagens envolvendo escaneamento intraoral etc. 
Então, toda a equipe pode se beneficiar dessa abordagem: aquilo que eu vejo, eu posso mostrar para você, posso mostrar para o TPD. É possível criar um plano de tratamento que eu diria que é incrível, muito superior em relação a uma abordagem tradicional.

MA – Com isso, outra pergunta surge: você usa apenas a abordagem digital?

FM – Eu diria que não. Porque depende do que você tem que fazer. Há casos, ainda que raros, baseados em aplicação cerâmica sobre um suporte refratário, em que você precisa da maestria do técnico. Com certeza, você deve seguir o caminho tradicional, não há necessidade de digitalizar. Mas, para casos complexos, especialmente quando é preciso planejar exatamente onde posicionar um implante para obter um resultado perfeito, o digital é muito bom.

MA – Ao contrário de muitos professores, você se especializou em muitas técnicas. Como a tecnologia te ajuda a decidir o que é melhor para cada caso?

FM – Quando observamos a medicina baseada em evidências, existem três caminhos. Um deles é a evidência interna, na qual você reconhece suas habilidades. O segundo caminho é a evidência externa, a literatura. O último é o desejo do paciente. Assim, considerando que sabemos da existência de técnicas diferentes para resolver um determinado problema, é possível combinar, com suas evidências internas, as melhores habilidades. E a tecnologia certamente nos ajuda muito, pois ela nos permite ver com mais clareza exatamente o que é preciso fazer. Por exemplo: se você tiver um caso com atrofia extrema, o software analisa todos os dados, identifica a situação e você sabe o que é necessário para chegar ao objetivo: um sorriso perfeito. A partir disso, você sabe qual osso está longe ou se não há estrutura óssea em outro lugar. Assim, dá para planejar uma abordagem zigomática. Há casos, no entanto, em que há um grande defeito na área frontal e não é possível remover os dentes para colocar o implante zigomático. Neste caso, você planeja, por exemplo, uma ROG. Como planejar o volume certo? Com a tecnologia, podemos identificar o quadro e planejar exatamente o que queremos.

MA – Você equilibra muito bem sua vida pessoal com a profissional. Ouvi dizer que você também é esportista. Como você encontra tempo para fazer o que quer, sempre da melhor forma?

FM – Provavelmente eu sempre fui competitivo, desde criança. Sempre pratiquei esportes, corrida, bicicleta e esqui. Tanto no esporte quanto na Odontologia, é preciso ter foco em um objetivo. No meu caso, a meta é sempre obter um ótimo resultado. Minha vida é assim, preciso de metas e desafios. Para isso, é preciso treinar muito. Lembro, por exemplo, de um dos meus últimos desafios: a One Hundred️ World Series, uma ultramaratona de 100 milhas (aproximadamente 160 km) realizada nas montanhas. Eu treinava todos os dias. Com toda certeza, quando você é muito dedicado, o resultado chega.