Victor Montalli aborda a Bibo (barreira individual de biossegurança odontológica), um suporte que permite o controle da dispersão de gotículas e aerossóis.
A Covid-19 trouxe à tona uma intensa discussão sobre a viabilidade do nosso ofício em um período de pandemia, bem como as alternativas de segurança nesse cenário. Porém, vale ressaltar que não é de hoje que os profissionais de saúde bucal se preocupam com a proteção contra agentes infecciosos em ambiente odontológico. Uma vez que ainda não dispomos de terapias comprovadas contra o vírus SARS-CoV-2, e o número de infectados cresce a cada dia, torna-se urgente o debate sobre alternativas de segurança. Pensando na biossegurança dos profissionais, equipe e pacientes, os órgãos regulatórios (Anvisa, CFO e CRO) estabeleceram estratégias a fim de viabilizar os atendimentos de urgência e, em alguns estados, os procedimentos eletivos.
Neste período de incertezas, uma coisa é certa: a nossa profissão não foi e não será inviabilizada, mas atualizações em biossegurança precisam ser implementadas para a retomada segura. O uso de equipamentos de proteção individual (EPIs), como o respirador tipo PFF-2/N95, óculos de proteção com vedação, face shield, além de jalecos descartáveis com gramatura acima de 40 g/cm2, são, de maneira geral, as novidades para maior proteção do profissional e da equipe. Estes EPIs se fazem necessários devido à constante geração de gotículas e aerossóis durante o atendimento odontológico.
No atual contexto da pandemia, apesar das novas estratégias adotadas para minimizar o risco de infecção, um paciente pode estar infectado com o novo coronavírus mesmo que assintomático e, durante os procedimentos, existe o potencial risco do vírus contaminar o ambiente. Este vírus mede de 50 a 100 nm e, em previsões teóricas, alguns estudos sugerem que o tempo de deposição de partículas com estas dimensões em superfícies chegue até 40 horas. Deste modo, procedimentos e/ou equipamentos que gerem menos dispersão são altamente recomendáveis para a prática clínica cirúrgica, tais como a substituição da alta rotação por outros periféricos.
Diante deste novo cenário, dezenas de vídeos surgiram nas redes sociais com estratégias para controlar a dispersão de gotículas e aerossóis, porém de forma empírica. Dentre os vídeos, nos chamou a atenção um feito por uma colega que usava o filme de PVC e TNT acoplado a um bastidor (suporte para bordado) e preso no equipo odontológico por meio de um suporte universal articulado para smartphone. Nascia ali a Bibo – barreira individual de biossegurança odontológica. Trata-se de um suporte que pode ser feito ou adquirido pelo profissional, que permite o controle da dispersão de gotículas e aerossóis durante o atendimento clínico.
O movimento ou cultura maker, traduzido por “faça você mesmo”, apesar de estar sendo difundido no Brasil recentemente, já era uma estratégia amplamente adotada por educadores desde o início do século 20. Como estamos vivendo um momento em que a inovação, a sustentabilidade e o compartilhamento de ideias tornaram-se palavras de ordem, acreditamos que a Bibo se encaixa neste movimento e pode contribuir para a retomada segura das atividades dos profissionais de Odontologia.
O teste
Resolvemos testar este dispositivo no ambiente clínico. No local do reservatório do equipo odontológico, foi removida a água e adicionada uma solução contendo a bactéria Lactobacillus casei Shirota na concentração de 1,50 x 108 UFC/mL. Esta cepa foi escolhida para os testes pois é inócua para o equilíbrio do meio ambiente, assim como para os seres humanos, permitindo, portanto, a criação de um bioaerossol propositalmente contaminado no ambiente odontológico.
Tomando como referência o apoio da cabeça do equipo, foram alocadas placas nas distâncias de 50 cm, 100 cm e 150 cm nos ângulos de zero graus e 90 graus. A turbina de alta rotação foi ativada por um minuto utilizando ponta diamantada e um anteparo (dente fixado em resina acrílica), Figuras 1.
Para avaliar a capacidade de dispersão de microrganismos, foram realizados testes com e sem a Bibo. O equipamento testado possui exatamente as dimensões e características descritas – corresponde a um bastidor de 25 cm envolto por filme de PVC e TNT 40 g/cm2, medindo 1,5 x 1,5 m (Figuras 2).
As placas de Petri com meio enriquecido para Lactobacillus spp. mantiveram-se abertas durante 15 minutos. Em seguida, as placas foram para a estufa do laboratório de microbiologia e, após 48 horas, as unidades formadoras de colônia (UFC) foram contadas e comparadas com os resultados da alta rotação (com e sem a Bibo). Para visualização das gotículas, foi utilizado fluoresceína (Figura 3). Neste modelo de estudo, houve uma diminuição média de dispersão de microrganismos em 94,9% no ambiente odontológico (Figura 4).
Diante do exposto, a barreira individual de biossegurança odontológica (Bibo) pode ser uma alternativa economicamente viável, tecnicamente segura e cientificamente comprovada para controle da dispersão de gotículas e aerossóis em ambiente odontológico.
Clique aqui e confira o artigo original com a análise da Bibo.
Montalli VAM, Garcez AS, Montalli GAM, França FMG, Suzuki SS, Mian LMT et al. Individual biosafety barrier in dentistry: an alternative in times of Covid-19: preliminary study. RGO 2020;68:e20200018.
Victor Montalli
Doutor em Ciências Médicas, área de concentração em Patologia – Mestre e pós-doutorado em Patologia bucal, e professor dos cursos de graduação e pós-graduação – SLMandic.