Luis Guilherme Macedo compartilhou sua experiência com pacientes polifarmácia, abordou a relação cortical/medular, analisou a biopsia com trefina e revelou a maior complicação que já resolveu.
Com 25 anos de experiência na Implantodontia, Luis Guilherme Macedo já participou da formação de mais de 250 profissionais em Implantodontia e Periodontia, entre especialistas, mestres e doutores, além de mais de 400 cirurgiõesdentistas quando professor de graduação na Unesp, em São José dos Campos (SP). Atualmente, exerce atividades em pesquisa e docência na Faculdade de Odontologia São Leopoldo Mandic, nos cursos de especialização em Reabilitação Oral e mestrado em Implantodontia. Em conversa com a equipe da ImplantNews, Macedo compartilhou sua experiência com pacientes polifarmácia, abordou a relação cortical/ medular, analisou a biopsia com trefina e revelou a maior complicação que já resolveu.
1) Baseado em sua experiência, o que você considera o “treinamento mínimo” na Implantodontia?
Luis Guilherme Macedo – O cirurgião-dentista precisa entender o implante como uma das alternativas de reabilitação. Dessa forma, conceitos de prótese e oclusão precisam estar sedimentados para aqueles que farão as fases de planejamento e reabilitação. Para os que farão os procedimentos cirúrgicos, conhecimento de anatomia e cirurgia oral menor são essenciais. Entretanto, para que os implantes permaneçam em boca ao longo dos anos, a saúde dos tecidos ao redor é de extrema importância, o que torna o conhecimento que vem da Periodontia fundamental. Enfim, a Implantodontia é multidisciplinar. O que eu acredito como “treinamento mínimo” é o processo de educação escalonada, onde deve-se ter o conhecimento teórico de base, técnicas treinadas em laboratórios (manequins) e, após isso, o início da curva clínica de aprendizado. Todo cirurgião deve começar com casos mais simples de implantes, unitários, poucos elementos, e ir caminhando aos mais complexos à medida que adquire experiência, ou seja, casos que envolvem procedimentos reconstrutivos e o restabelecimento de curvas e de dimensão vertical. Falar em quantidade é difícil, pois depende muito da formação anterior e experiência que o profissional já possui em outras áreas.
2) Hoje, os cirurgiões-dentistas cada vez mais atendem pacientes polifarmácia, ou seja, que tomam quatro ou mais medicamentos de forma concomitante. De todos os problemas sistêmicos, qual tem sido a maior barreira na conversa com seus pacientes?
Luis Guilherme Macedo – Houve uma alteração considerável no perfil dos pacientes. Dessa maneira, posso colocar duas situações importantes. A primeira é que, atualmente, vemos a expectativa de vida aumentar. Além disso, as pessoas estão buscando qualidade de vida, independentemente da idade. Isso fez com que a média de idade dos pacientes que buscam reabilitação dentro do consultório aumentasse. Hoje realizo cirurgias em pacientes com mais de 70 ou 80 anos, algo que no passado não ocorria. Porém, em razão da idade, esses pacientes têm alguns problemas de saúde que os levam a fazer uso de medicamentos de rotina, seja para controle de algo ou de forma preventiva. A segunda é com relação à mudança de estilo de vida dos jovens, mais acelerados, ansiosos, estressados, com distúrbios do sono, muitos se alimentando mal e que fazem uso de alguns medicamentos para controle de tais situações. O que vemos em comum em ambos os quadros é o diabetes. Temos quase 20 milhões de diabéticos no Brasil, segundo os últimos dados do Ministério da Saúde. Esses pacientes podem apresentar problemas periodontais, perda óssea ao redor dos implantes, maior índice de peri-implantite e infecções pós-operatórias. Hoje a barreira que encontro é fazer o paciente entender que ele precisa cuidar da própria saúde para executar o procedimento cirúrgico, e compreender que, após a instalação de um implante, os próximos meses são de osseointegração, que pode ser colocada em risco caso ele não se cuide. Isso sem falar na possibilidade de atrapalhar todo o processo reabilitador.
3) Antes, durante ou depois da cirurgia: qual foi a maior complicação que você já resolveu?
Luis Guilherme Macedo – São várias, cada uma com sua particularidade que gerou desconforto e estresse de momento. Mas posso destacar um caso de hemorragia em elevação de seio maxilar em um paciente no qual eu já tinha feito o mesmo procedimento do lado esquerdo, além de vários outros implantes, e tudo sem intercorrências. O paciente retornou ao meu consultório com sangramento intenso cerca de 15 minutos após liberação, apreensivo e preocupado. Porém, conseguimos conter o quadro com algumas manobras clínicas e o uso de anti-hemorrágicos. Não foi algo rápido, confesso que foi bastante tenso para mim e para a minha equipe naquele momento, já que o sangramento não estancava. Mas no final deu tudo certo.
4) Enxertia: como você vê a relação cortical/ medular? Quais áreas intraorais são as melhores? Existe uma área mais fácil de lidar na hora da coleta?
Luis Guilherme Macedo – Interessante que essa discussão foi bastante ativa no início dos anos 2000, um período em que utilizamos os blocos autógenos em todas as reconstruções ósseas. O conhecimento da anatomia sempre foi fundamental porque, em alguns casos, nós necessitávamos da presença de cortical para manutenção do enxerto em bloco, evitando contrações, já que é um tecido mais estável. Porém, a presença de medular nos dá um maior potencial biológico ao enxerto, em virtude do maior aporte celular, vascular e de fatores de crescimento. Sempre utilizamos o mento como fonte primária, não somente pela característica córtico-medular, mas pela facilidade de acesso e quantidade disponível. Apesar dessas vantagens, o grau de morbidade dos pacientes sempre nos incomodou, já que gerava hematomas, edemas, alterações sensoriais e dores, fazendo com que o pós-operatório fosse bem desconfortável. Atualmente, com o conhecimento disponível, não temos dúvidas de que o osso autógeno ainda é o melhor do ponto de vista biológico. No entanto, mudou a nossa forma de trabalhar, ou seja, hoje eu consigo usar todos os benefícios biológicos do autógeno, coletando-o de maneira precisa e menos mórbida aos pacientes. Entendemos que se usarmos os chamados “chips” de osso autógeno misturados a um bom biomaterial condutor conseguiremos unir forças, aliando os benefícios biológicos (células, fatores de crescimento e proteínas) à manutenção de volume dos biomateriais condutores de reabsorção lenta. O chamado “enxerto composto” tem sido descrito e utilizado nas grandes reconstruções com total sucesso, em proporções de 50% de cada e de 70% autógeno/30% biomaterial, dependendo do grau de criticidade do defeito.
5) Você vê a biopsia com trefina para determinar a qualidade óssea como uma rotina na Implantodontia? O que falta para popularizar esse procedimento?
Luis Guilherme Macedo – A biopsia com trefina tem sido usada como metodologia de análise há muitos anos no ambiente acadêmico, em pesquisas, onde podemos determinar com fidelidade alguns parâmetros a fim de caracterizar o tecido formado. O método é interessante, pois nos dá uma avaliação da qualidade, permitindo identificar e quantificar as células, o comportamento do material utilizado, bem como a expressão de marcadores bioquímicos importantes no processo regenerativo. Do ponto de vista clínico e como rotina diária para os cirurgiões, seria bem interessante, já que daria uma informação real do tecido em que os implantes estão sendo instalados, informação de quanto tempo deveríamos aguardar para ativação e, do ponto de vista legal, seria um respaldo a mais ao profissional. Porém, vejo alguns entraves para que isso se torne rotina: o primeiro é o momento em que fazemos a trefina, pois condiz com o momento em que instalamos os implantes. Sendo assim, só teremos as respostas da qualidade tecidual após os implantes estarem instalados. Além disso, o processo depende de estrutura laboratorial terceirizada, e a grande maioria dos colegas não está familiarizada e apta a interpretar tais resultados. Vejo que hoje nós temos tecnologia de exames de imagem que nos dá informações que nos permitem trabalhar com segurança. Os exames tomográficos estão mais precisos e com menos artefatos do que no passado, e associado a isso temos os softwares que nos permitem avaliar a qualidade do tecido ósseo. Do ponto de vista clínico, temos dispositivos que nos permitem avaliar a estabilidade dos implantes por meio da análise de frequência de ressonância. Dentro disso, penso que a biopsia continuará dentro do ambiente acadêmico.