Marco Bianchini explica que o aumento da coroa clínica é um procedimento extremamente delicado, que deve ter em mente as práticas que vêm em sua decorrência.
Também conhecida como osteotomia/osteoplastia, com o posicionamento apical do retalho, o aumento de coroa clínica consiste na remoção do osso que circunda um dente que teve o seu espaço biológico violado por uma cárie, restauração, coroa protética ou fratura¹. Esta remoção óssea visa restabelecer a distância mínima do término cervical até a crista óssea em, pelo menos, 3 mm, a fim de acomodar o sulco gengival, epitélio juncional e inserção conjuntiva (espaço biológico)². O tecido gengival também deverá ser removido ou suturado em uma posição mais apical, para que o aumento da estrutura dental supra-alveolar possa ser realmente efetivo.
Vale lembrar que o espaço biológico é o espaço virtual compreendido entre o pico gengival e a crista óssea alveolar, preenchido pelos tecidos moles que compõem as distâncias biológicas: epitélio sulcular, epitélio juncional e inserção conjuntiva, com um comprimento médio mínimo necessário no sentido axial de aproximadamente 3 mm1-3 (Figura 1).
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Em uma linguagem clínica, pode-se dizer que o aumento de coroa clínica deve ser utilizado para invasões discretas do espaço biológico. Invasões maiores e profundas contraindicam a técnica, pois a quantidade de tecido ósseo a ser removida seria muito grande, comprometendo os dentes vizinhos e a proporção coroa-raiz, enfraquecendo o remanescente dental, que ficaria extremamente suscetível à fratura ou ao aumento de mobilidade, devido a não suportar as cargas mastigatórias.
Na verdade, a maioria dos dentes que requisitam uma cirurgia de aumento de coroa clínica acaba por necessitar também de uma provável endodontia, confecção de núcleo intrarradicular e coroa protética total, o que acabaria enfraquecendo muito o dente, o deixando mais suscetível à fratura. Isto posto, parece ser mais razoável se partir diretamente para a exodontia do elemento e a confecção de um implante osseointegrado, que teria uma maior previsibilidade 4-5.
O que ocorre é que, muitas vezes, o dente que está sendo avaliado para receber um aumento de coroa clínica também não oferece condições ideais para que seja extraído e se coloque um implante em seu lugar. Deficiências ósseas e gengivais podem contraindicar o implante, exigindo enxertos de tecidos duros e moles prévios a este implante, aumentando o tempo de tratamento, a morbidade e, em algumas situações, até mesmo a previsibilidade de sucesso4-5.
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Na Periodontia, bem como na Implantodontia, as “receitas prontas” geralmente estragam o bolo. Torna-se necessária uma avaliação criteriosa de cada caso para decidir se o aumento de coroa clínica deve ser realizado ou não, levando um dente à extração para a colocação de um implante. As Figuras 2 a 5 demonstram um caso clínico que exemplifica bem alguns critérios para esta tomada de decisão.
Após a avaliação clínica e radiográfica, optou-se pela confecção de um aumento de coroa clínica no dente 16, onde a invasão do espaço biológico era mais discreta. Já no dente 26, onde havia maior disponibilidade óssea para um implante e a invasão do espaço biológico era mais intensa, optou-se pela exodontia e pela colocação de um implante imediato.
Referências
1. Pilalas I, Tsalikis L, Tatakis DN. Pre-restorative crown lengthening surgery outcomes: a systematic review. J Clin Periodontol 2016;43(12):1094-108.
2. Gargiulo AW, Wents FM, Orban B. Dimensions and relations of the dentogingival junction in humans. J Clin Periodontol 1961;32:261-7.
3. Ercoli C, Caton JG. Dental prostheses and tooth‐related factors. J Clin Periodontol 2018;45(suppl.20):207-18.
4. Donos N, Laurell L, Mardas N. Hierarchical decisions on teeth vs. implants in the periodontitis-susceptible patient: the modern dilemma. Periodontol 2000 2012;59(1):89-110.
5. Pjetursson BE, Heimisdottir K. Dental implants – are they better than natural teeth? Eur J Oral Sci 2018;126(suppl.1):81-7
Marco Bianchini
Professor associado IV do departamento de Odontologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); autor dos livros “O Passo a Passo Cirúrgico na Implantodontia” e “Diagnóstico e Tratamento das Alterações Peri-Implantares”.