Marco Bianchini pondera que, de todos os componentes do sulco gengival, o epitélio juncional parece ser o mais importante.
O entendimento da formação do sulco gengival pode ser a resposta para muitos dos problemas enfrentados pelos profissionais da Odontologia, em especial durante a restauração de áreas vizinhas a este importante componente anatômico periodontal. O sulco gengival é formado quando o dente irrompe na cavidade oral. Neste momento, o epitélio reduzido do órgão do esmalte une-se com o epitélio oral, transformando-se em epitélio juncional e formando uma larga faixa aderida à superfície dentária. Este processo de formação do sulco gengival dura cerca de um a dois anos.
O sulco gengival é um espaço raso em forma de “V”, produzido entre o dente e a gengiva. O sulco localiza-se coronalmente à aderência do epitélio juncional e está limitado de um lado pelo dente e do outro pelo epitélio do sulco.
A extensão coronária do sulco gengival corresponde à margem gengival. A determinação clínica da profundidade do sulco gengival é um importante parâmetro para o diagnóstico da saúde gengival e periodontal.
Em um periodonto totalmente normal, sem qualquer sinal de inflamação ou presença de biofilme, a profundidade do sulco gengival é praticamente zero. Entretanto, um sulco com profundidade um pouco acima de zero também pode ser encontrado em condições de normalidade. Essa variação pode ocorrer de acordo com variações anatômicas. Em média, o sulco gengival atinge no máximo 1 mm. A partir deste ponto, já se inicia o epitélio juncional. A Figura 1 ilustra os componentes anatômicos dos tecidos epitelial e conjuntivo que caracterizam a união dentogengival e adjacências.
Na periodontite propriamente dita, o que ocorre é um aprofundamento patológico do sulco, chamado de bolsa periodontal. Ou seja, ocorre uma destruição dos níveis normais do cemento, ligamento periodontal e osso alveolar, levando o dente a perder seus tecidos de suporte. Todo este processo tem início no sulco gengival, que deve estar sempre saudável. A “introdução” inadequada de materiais restauradores no sulco gengival, que estimulem a formação de biofilme e comprimam o epitélio juncional, pode ser o gatilho para o início da destruição periodontal. A Figura 2 ilustra a invasão bacteriana do sulco gengival e a transformação do mesmo em bolsa periodontal.
De todos os componentes do sulco gengival, o epitélio juncional parece ser o mais importante, pois é a última barreira para o acesso bacteriano ao tecido conjuntivo. Esta união epitelial juncional consiste em uma faixa com formato de colar, formado por um epitélio escamoso não queratinizado. Ele tem uma espessura de poucas camadas no início de sua formação (três a quatro camadas), que aumentam com a idade, podendo atingir até 20 camadas.
O epitélio juncional tem uma função primordial na anatomia do periodonto, pois se adere tanto ao epitélio sulcular (em direção coronal) como à inserção conjuntiva (em direção apical). Ele é considerado uma união frágil e forte ao mesmo tempo, pois se adere através de hemidesmossomas (união mais fraca) ao esmalte dental e através de fibras gengivais (união mais forte) na porção radicular. Sendo assim, o epitélio juncional funciona ao mesmo tempo como uma porta de entrada de bactérias e uma área de saída para as células de defesa. O epitélio juncional, juntamente com as fibras gengivais, “aperta” a gengiva marginal contra a superfície dentária e promove um selamento biológico, também conhecido como unidade ou união dentogengival.
O selamento biológico proporcionado pela união dentogengival é liderado pelo epitélio juncional. O rompimento desta união é o que dá início ao processo destrutivo das doenças periodontais, daí a importância de conhecermos profundamente a anatomia do sulco gengival e o mantermos sempre saudável.
Vale lembrar que a doença periodontal ocorre quando temos um desequilíbrio entre a agressão bacteriana e a suscetibilidade do hospedeiro. Contudo, este desequilíbrio também pode acontecer por iatrogenias feitas por profissionais, que insistem em colocar restaurações excessivamente subgengivais invadindo o espaço biológico.
Referências
- Ercoli C, Caton JG. Dental prostheses and tooth-related factors. J Clin Periodontol 2018;89(suppl.1):223-36.
- Lang NP, Bartold PM. Periodontal health. J Clin Periodontol 2018;45:9-16.
- Lang NP, Kiel RA, Anderhalden K. Clinical and microbiological effects of subgingival restorations with overhanging or clinically perfect margins. J Clin Periodontol 1983;10(6):563-78.
- Schätzle M, Lang NP, Ånerud Å, Boysen H, Bürgin W, Löe H. The influence of margins of restorations on the periodontal tissues over 26 years. J Clin Periodontol 2001;28(1):57-64.
Marco Bianchini
Professor titular das disciplinas de Periodontia e Implantodontia do Depto. de Odontologia – Universidade Federal de Santa Catarina; Autor dos livros O Passo a Passo Cirúrgico na Implantodontia e Diagnóstico e Tratamento das Alterações Peri-implantares.