A seleção de cor por meio de dispositivos digitais chega ao mercado com o intuito de simplificar essa etapa clínica, inclusive em restaurações anteriores.
O quão desafiador é acertar a cor de um incisivo central superior logo na primeira tentativa? Esta situação, apesar de enfrentada com certa frequência, é considerada difícil por grande parte dos profissionais. Isso se deve ao fato da cor ser um dos aspectos mais complexos a serem tratados na Odontologia.
Será que descrever a cor como um fenômeno tridimensional composto por valor, croma e matiz é o suficiente? A cor, além de uma manifestação física, é capaz de nos provocar sensações¹ . Quando uma pessoa sorri, a coloração de seus dentes pode afetar a percepção de terceiros quanto à sua capacidade intelectual, comportamento psicossocial e bem-estar. Atualmente, sabe-se que a insatisfação com a cor do dente pode atingir até 65% da população. Este incômodo e seu impacto social influenciaram no aumento da busca por sorrisos mais harmônicos2-4.
O sucesso de uma restauração estética anterior, em grande parte das vezes, é relacionado pelos pacientes à aparência. Ou seja, antes mesmo de sua função ou conforto, o paciente avalia o resultado estético, mais especificamente, a cor5-6. Tal fato evidencia uma das etapas mais desafiadoras durante um procedimento restaurador: a escolha da cor da restauração protética. De métodos empíricos e subjetivos, como as escalas de cor, até o uso de máquinas fotográficas, espectrofotômetros e colorímetros, novas técnicas têm sido aprimoradas com o auxílio da tecnologia. Estes mecanismos estão em constante evolução para que a interpretação e transmissão de informações dos tecidos dentários sejam as mais precisas possível. Assim, as repetições de trabalhos podem ser evitadas e a reprodução das propriedades ópticas chega o mais próximo do dente natural7-8.
Com o auxílio da inteligência artificial, tem sido empregado um novo dispositivo digital para mensuração de cor (Optishade, Smile Line), Figura 1. A solução nada mais é do que um colorímetro associado a um filtro polarizador, capaz de medir as cores e descrevê-las por meio dos valores L*a*b*, segundo o espaço de cores CIELAB, definido pela Comissão Internacional de Iluminação, em 1976, no qual L* refere-se à luminosidade, e a* e b* referem-se ao eixo de cor verde-vermelho e azul-amarelo, respectivamente (Figura 2).
O colorímetro associado ao aplicativo (sistema iOS, Apple) é capaz de mensurar com precisão a cor da estrutura dentária e compartilhar essas informações com o laboratório que realizará a prótese dentária. Adicionalmente ao simples envio destas informações ao técnico, pode-se usufruir também da tecnologia de softwares que disponibilizam uma receita para que o protético seja guiado durante a escolha da cerâmica e sua estratificação, atingindo o resultado previsto (Figura 3).
Ao dispensar a necessidade de uma máquina fotográfica profissional com filtros polarizadores para seleção da cor, o processo torna-se mais prático e elimina alguns fatores de subjetividade. A tecnologia, além de oferecer a precisão de um colorímetro, entrega também maior previsibilidade e resolutividade dos casos, possibilitadas pela integração existente entre o Optishade com outros softwares. Ainda, é interessante ressaltar que o registro do aplicativo no celular não é pago, sendo necessária a aquisição apenas do colorímetro. Pelo aplicativo, ao final da reabilitação, é possível analisar o resultado do tratamento por meio da aba de comparação (Figura 4). Inclusive, essa funcionalidade pode ser utilizada para outros fins, como o acompanhamento de clareamento dentário.
Novas ferramentas têm sido inseridas para auxiliar no dia a dia clínico do dentista e é natural que surjam novos desafios. O correto posicionamento do aparelho em boca para a medição pode ser um ponto de atenção nos primeiros usos, assim como o controle da umidade durante a medição. Idealmente, o paciente deve segurar a respiração durante o procedimento. Ainda, cuidados com a luz do ambiente devem ser tomados. A contaminação da medição com luz excessiva leva a um valor com baixa acurácia. Então, o controle da quantidade de incidência de luz é um dos fatores mais importantes a serem observados anteriormente ao uso do dispositivo. Por fim, deve-se lembrar que o dente analisado está inserido em um contexto, em que os demais dentes e a gengiva causam reflexos em sua superfície.
Portanto, a seleção de cor por meio de dispositivos digitais, como o Optishade, chega ao mercado com o intuito de simplificar essa etapa clínica, assim como a comunicação entre o dentista e o laboratório protético, além de reduzir a possibilidade de retrabalhos/ frustrações e aumentar a satisfação do paciente. Vale ressaltar que, apesar da técnica descrita anteriormente demonstrar boa repetibilidade e confiabilidade, uma dupla avaliação com os demais métodos já conhecidos é sempre bem-vinda.
Referências
- Nassau K. Color for Science, Art and Technology (1st). Elsevier Science, 1997.
- Odioso LL, Gibb RD, Gerlach RW. Impact of demographic, behavioral, and dental care utilization parameters on tooth color and personal satisfaction. Compend Contin Educ Dent Suppl 2000;29:S35-41; quiz S43. PMID: 11908408.
- Samorodnitzky-Naveh GR, Geiger SB, Levin L. Patients’ satisfaction with dental esthetics. J Am Dent Assoc 2007;138(6):805-8.
- Newton JT, Subramanian SS, Westland S, Gupta AK, Luo W, Joiner A. The impact of tooth colour on the perceptions of age and social judgements. J Dent 2021;112:103771.
- Miller LL. Shade matching. J Esthet Dent 1993;5(4):143-53.
- Awdaljan M. Achieving a single central shade match at the first attempt (16th edition). GC get connected 2020. p.8-12.
- Wang J, Lin J, Gil M, Seliger A, da Silva JD, Ishikawa-Nagai S. Assessing the accuracy of computer color matching with a new dental porcelain shade system. J Prosthet Dent 2014;111(3):247-53.
- Dudea D, Gasparik C, Botos A, Alb F, Irimie A, Paravina RD. Influence of background/surrounding area on accuracy of visual color matching. Clin Oral Investig 2016;20(6):1167-73.
Coordenação:
Diogo Viegas
Pós-graduado e técnico em Prótese Dentária, doutor em Ciências da Reabilitação Oral e professor assistente convidado de Prótese Fixa e Reabilitação Oral – FMDUL, em Portugal.
Autora convidada:
Tatiana Cursino Pereira
Mestranda em Dentística – Unesp São José dos Campos; Colaboradora externa em Prótese Dentária – Faculdade de Medicina Dentária da Universidade de Lisboa.
Orcid: 0000-0003-2393-0123.